Os primeiros estudos sobre as Dificuldades de
Aprendizagem (DA) surgiram nas áreas das ciências biológicas e médicas no
século XIX, de modo que conceitos de anormalidade diante da observação da
incapacidade de algumas crianças em aprender eram atribuídos a alguma
anormalidade orgânica. Segundo consta, os primeiros especialistas que se
ocuparam de tratar as DAs foram os médicos que associavam o fracasso ao déficit
intelectual, ou seja, ao baixo QI[1]. Segundo Patto (2000):
Inicialmente
circunscrita à avaliação médica segundo os quadros clínicos da época, a
avaliação dos “anormais escolares” tornou-se, durante os 30 primeiros anos do
século XX, praticamente sinônimo de avaliação intelectual. Nesta época os
testes de QI adquiriram um grande peso nas decisões dos educadores a respeito
do destino escolar de grandes contingentes de crianças, que na Europa e na
América, conseguiram ter acesso à escola.
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Bossa (2002) indica
que os testes de QI (psicometria) dificultaram durante muitos anos a integração
do estudo da personalidade, no plano profundo com as dificuldades de
aprendizagem e concorda com Ocampo (1994) quando este afirma que:
No campo das
dificuldades de aprendizagem, o que importa não é considerar apenas o potencial
intelectual demonstrado pelo sujeito no momento do exame, mas também o
potencial que possui e não pode usar. Neste sentido, somente estudando a
singularidade do sujeito podemos compreender o sentido do sistema escolar. (p.23)
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Alguns autores tomam
o fracasso escolar como uma patologia,
ou como um sintoma escolar. Este segundo é abordado mais especificamente pela
ótica Psicanalítica. Ou seja, conceitos de
anormalidade e patologia se transferiram dos hospitais para as escolas. Conforme
Scoz (1994), as crianças que não acompanhavam seus colegas na aprendizagem
passaram a ser designados como anormais escolares, já que seu fracasso era
atribuído a alguma anormalidade orgânica.
Devido à incorporação
dos conceitos psicanalíticos na área médica, houve uma modificação na concepção
a respeito das causas das dificuldades de aprendizagem. Foram incorporados às
explicações para as possíveis causas do insucesso escolar os fatores de ordem afetiva e de personalidade. As
crianças com dificuldade de aprendizagem passaram a ser denominadas ‘crianças
problema’. “[...] de anormal, a criança que apresentava problemas de ajustamento
ou de aprendizagem escolar passou a ser designada como criança problema”. (PATTO,
2000, p. 45).
Baseado
na conceitualização internacional – DSM-IV[2], a
dificuldade de aprendizagem caracteriza-se por um funcionamento essencialmente
abaixo do esperado, levando em consideração a idade cronológica e o quociente
intelectual do individuo.
De acordo com Golbert e Moojen (1996, p. 80),
“a expressão Dificuldade de Aprendizagem (DA) tem sido utilizada em múltiplos
sentidos devido, fundamentalmente, à diversidade de fatores intervenientes no
processo da aprendizagem humana.”
[1]
O
primeiro teste de inteligência foi criado por Alfred Binet, então diretor do
laboratório de psicologia da Sorbonne, por solicitação do Ministério da
Educação da França. Ele elaborou um instrumento que consistia de um conjunto de
tarefas breves, relacionadas aos problemas da vida quotidiana, que,
supostamente, implicavam certos procedimentos racionais básicos, para
identificar crianças que necessitariam de educação diferenciada. Binet, no
entanto, defendia que a inteligência era por demais complexa para ser expressa
por um único número (QI) e negou-se não apenas a qualificar o QI como inteligência
inata, como também a considerá-lo um recurso geral para a hierarquização de
alunos, segundo seu valor intelectual, chegando mesmo a prever a possibilidade do
mau uso de suas escalas de inteligência. (Revista Psicologia: Reflexão e Crítica,
2002, 15(2), pp. 261-270)
[2]
Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais é uma publicação
da American Psychiatric Association,
Washington D.C., sendo a sua 4ª edição conhecida pela designação “DSM-IV”. Este
manual fornece critérios de diagnóstico para a generalidade das perturbações
mentais, incluindo componentes descritivas, de diagnóstico e de tratamento,
constituindo um instrumento de trabalho de referência para os profissionais da saúde
mental. (Disponível em: http://psicologianiltonlins.no.comunidades.net/index.php?pagina=1744050125)
REFERÊNCIAS
OCAMPO,
M. L. O processo psicodiagnóstico e as técnicas projetivas. 7. Ed. São
Paulo: Martins Fontes, 1994.
PATTO,
M. H. S. A produção do fracasso escolar: histórias de submissão e
rebeldia. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2000.
______. Introdução
à psicologia escolar. São Paulo: T. A. Queiroz, 1991.
SUKIENNIK, Paulo
Berél (Org.) O aluno problema:
transtornos emocionais de crianças e adolescentes. Porto Alegre: Mercado
Aberto, 1996.
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